Publicamos a letra de uma composição musical, gentilmente compartilhada e parafraseada pelo próprio autor, disponível aqui ou também nesta página, clicando no título.

Ego Flip

~Intro~
Só na mente de quem ouve falo pouco ou mais que nada
Mantenho o ritmo em brasa quente saio pela calada
Mantenho a rima solta e breve mas ela volta como sempre
Mantenho me feliz e inteiro muito mais do que muita gente
Meio potente sai o som mas sinto a cena bem pobre
Cuspo ouros e platinas e só me apelidam de cobre
É importante ser da street e saber o que dizer
Mais importante é ter Q.I. e dizer do meu saber
Manda ver sim senhor mantenho o ritmo desenfreado
Porque para ser o Trance Hop não posso ser tão vexado
E tirar do próprio sarro quantas vezes não faço
E sinto a cena a puxar hard como se desse embaraço
Ao pessoal que é do aço mas só estrica o sentir
Eu sou soft é verdade – mas ponho a cena a fluir
Ponho a synth a ganir e ponho os graves a dobro
A minha cena é bem diferente e daqui não há recobro
E se cobro do que faço que é o que toda a gente faz
Vou ser aço também e bater a seta com o Ás
E se a cena der pro torto tenho trunfos na mão
Tal como drunfos na cabeça só assim eu sou são
Mas então pensas tu que a droga é só pra curtir
Eu não puxo pra bater eu puxo pra prevenir
Que o sentir suba à cabeça e venha o sangue a saber
Que sem a pica eu acelero e desfaço do pobre bater
Do coração que o Deus quer – Eu sou eu tu és tu
Alma vai mente vai – até o corpo vai nu
Para o lado da mentira que aqui chamam além vida
Mando som pra cabeça a par da falsa partida
Prevenida a mente sã a mim jornada mundial
Vai o papa vem aí prepara o avé Portugal
Que está mal dizer assim e no fim fazer assado
Se é verdade está mal e se está mal é pecado

~3xBass~
Todavia este meu estado – é uma ideia conexa
É puro o estado de espírito – é uma imagem complexa
Que se o verde não presta, o carmim também não
E se o níveo te enoja a mim enoja o alcatrão
Todo o mundo é modo são, mas este mundo é doente
Ser humano é racional, mas racional é ser gente
Tipo mestre ou servente e se fossemos irmandade
Daqui a mais estou como o outro a pregar da saudade
Enquanto escrevo (como faço) – enquanto rimo (como devo)
Enquanto paro meio tempo – p’ra cena ganhar o relevo
Enquanto torno inquieto – com a maior cena que tenho
Nem é questão de volume – é mais questão de engenho
E aguçando a visão explano o ponto de vista
Nem é cadência rimada é mais uma rima p’rá pista
E nesse sonho de ser artista cantei a arte em três zero
Nem importa nada falhar, mas se eu falhar serei mero
Conto de fadas ou de clero – e que não falte intenção
Ser humano é ser humano – assim o que é a razão
Desta forma – com que então… falta energia no mundo?
Eu sou cento e cinquenta e dois – solar amarelo e oriundo
Deste kin que vem do fundo – e kin do meu é família
Tive s’toras de português que já pareciam mobília
Da casa onde na vigília logrei bem fácil os oitenta
E era bom que não o fosse mas trago pelo na venta
É uma história que arrebenta – já foste ao quadro rapaz
Passava secas demais – a pensar como se faz
De um destino capataz que é forçoso na escola
É o lavar de mentes jovens é o treinar verga mola
Toda a vida – qual estarola – esqueci de como ser bem
E fui só mais ou menos – como todo o mundo e ninguém
Que o melhor da minha vida é o que vês de presente
Sou todo o mundo e ninguém: sou melhor que muita gente
~Break~
E assim – sempre crente – que o grave é pura energia
Canto são e coerente – a minha antifantasia
Eu rebentei a coluna – e a cabeça – e o joelho
Esqueci-me de deixar estar e tornei me um gajo velho
Mas ao espelho nunca digo – tu ‘tás mal ou vai te embora
Digo sempre mais que muito: “tudo tem a sua hora”
Como a senhora que cá tivemos e que enjeita no cofre
Essa senhora que é gatuna mas pouca gente já sofre
Esse crápula que sou – quando fumo da verde
Mato a fome de mim próprio: sou quem ganha e quem perde
Encontro resposta nas perguntas – mais idiotas
E rio-me de factos chocantes – e choro com anedotas
E o diz que disse dá medo – quem fala mal fala bem
E se eu sou meio tolo sim – serás meio tolo também?
Eu só sei que cada um – carrega a cruz que carrega
Eu só sei que esfrego o olho enquanto o diabo também esfrega
E de forma muito cega dou nó cego tramado
Eu ia para rimar mais umas cenas mas tornei no pecado
E dropei a cabeça – e dei demência precoce
E fui o que devia ser: mais um gajo na cross
Só se sofrer vera a tosse é que largo este meu correr
Eu sou fado se o quiseres e o que interessa é querer
E a saber como fizemos (‘tamos todos queimados)
A mim inverno nuclear – a mim o fado dos fados
A mim celsius cinquenta – e o derreter na estrada
A mim a história podre e fraca – em forma conto de fada
A mim saber que vamos todos – e mesmo assim vou sozinho
A mim de novo essa rua – o meu primeiro caminho
Que quando eu era pequenino – mesmo antes de o ser
Eu escrevia para ti – mesmo antes de saber
Que escrevia para ti – e era p’ra ti que eu escrevia
Não parava porque quando parava, sentia que morria
~3xBass~
E eu… sei sei sim!
E eu… eu vou-me virar!
E eu… ai que desgraça!
E eu… deixa-me em pó!

(Derivado de “Canção Fulminante”)


Uma breve explicação do que senti para este texto: a pirueta do ego (entenda-se pelo título: surto psicótico).

O texto é uma tentativa de emulação do discurso esquizofrénico: aqueles momentos em que se fala de tudo, sem se dizer nada de jeito. 

Esta passagem é sobre a aceitação da medicação (drunfo é jargão de rua para medicação). 

Os momentos de claridade na doença – onde contactamos com deus e o vento fala connosco.

Os anos que perdi em auto estigma. Tornei-me velho. Problemas crônicos de saúde: Coluna cabeça e joelho. Tudo isto porque me dei a uma substância que para a maioria é uma droga leve:

***

Mad in Portugal acolhe blogues de diversos autores. Estas publicações foram concebidas para servirem de fórum público de debate – em termos gerais – sobre a psiquiatria e os seus tratamentos. As opiniões expressas são as dos próprios autores.

1 COMENTÁRIO

  1. Um caminho diário
    Uma luta sem fim
    Muitas conquistas a cada ravina
    Muita poesia curativa
    Nunca é o fim
    Nunca é o fim
    Parabéns por toda a tua louca consciência
    Luta, luta, luta
    Nunca é o fim
    Amanhã, há sempre um amanhã
    Variações já o anunciava
    O teu caminho será um caminho
    Um caminho para outros
    Se acreditarem que é possível
    Possível será

    Será possível

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