[Nota: O texto original está disponível no blogue “Of Unsound Mind” de Sasha Durakov Warren, ativista e autor cujo recente livro “Storming Bedlam: Madness, Utopia and Revolt” (Common Notions, 2024) também recomendamos, aproveitando para lhe agradecer a autorização à partilha da seguinte tradução para português.
Apresentando uma série de proposições em torno da relação entre loucura e método, o autor especifica que “estas não pretendem ser nem demonstrações de factos sobre o estado das coisas nem receitas para radicais e activistas em início de carreira, mas apenas reflexões destiladas, perguntas e provocações”. É com esse mesmo espírito, portanto, que apresentamos aqui no Mad in Portugal o seu texto traduzido para a comunidade Mad no Mundo.]
Traduzido por Mattia Faustini
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1. A loucura é, ela própria, uma estratégia.
Esta espécie de sabedoria é tão antiga como o próprio conceito de loucura. No Fedro, Sócrates reconhece as formas de loucura benéficas e necessárias: a arte maníaca da profecia, o jorro báquico da poesia e o retiro ou “alívio das maiores pragas da angústia” (244c-e). Quais são as loucuras em “I Never Promised You a Rose Garden”, de Joanne Greenberg, “A Question of Power”, de Bessie Head, ou em qualquer dos contos de Anna Kavan, se não viagens por caminhos não pavimentados e densamente arborizados para uma nova vida e uma fuga aos antigos horrores? Em passeios místicos através do Inferno interior e do ninho de irracionalidade que abriga o Inferno sem iguais, a loucura é melhor entendida como um evento estratégico. Mesmo certos psiquiatras e a psicanálise sabem-no. Freud, no seu texto sobre Schreber, escreve que “a formação de delírios, que consideramos um produto patológico, é na realidade uma tentativa de recuperação, um processo de reconstituição” (147). R.D. Laing reconhecia o mesmo: “sem exceção, a experiência e o comportamento que é etiquetado como esquizofrénico é uma estratégia especial que a pessoa inventa para viver numa situação inviável” (95). As estratégias loucas são métodos de sobrevivência e de cura. A poeta Jody Chan abordou este tema de forma bastante explícita num novo poema intitulado “Madness is a Strategy”. Recordam-nos que, por vezes, a loucura se justifica enquanto explosão de raiva, ou é mesmo necessária enquanto “estrutura de possibilidade” que “pode obrigar-nos a construir laços que resistam a períodos de crise, a projectos políticos, a constrições do capitalismo”. Encarar a loucura desta forma não é reduzir a experiência da insanidade ou da doença mental a uma questão de escolha consciente para a pessoa louca, nem chamar-lhe uma escolha feliz. Não é frequente escolhermos as estratégias que nos sustentam, e é comum termos de fazer sacrifícios para sobreviver ao jogo.
2. As estratégias podem parecer uma loucura.
Pode acontecer que aquilo a que se chama loucura seja uma patologização de actos de resistência. Neste caso, a loucura é um reflexo distorcido de estratégias militantes, que são patologizadas. Isto é notoriamente comum em situações revolucionárias e guerras anti-coloniais. Durante a Comuna de Paris, Briere de Boismont escreveu:
Há ainda fanáticos que sonham em refazer o mundo através de esquemas exequíveis, sendo estes os primeiros elementos da loucura demagógica; mas há sobretudo uma multidão de indivíduos que têm ideias sobre a família, a propriedade, a liberdade individual, a inteligência e a constituição da sociedade que são tão opostas à natureza humana que só a loucura as pode explicar. (Em Murat, 216)
O trabalho psiquiátrico de Fanon persiste na indecidibilidade que resulta da tentativa de reconhecer a loucura num sistema colonial de violência e degradação imensas e diárias, combinada com o desejo da administração colonial de diminuir a legitimidade da resistência, caracterizando-a como a expressão de transtornos mentais. À psiquiatria colonial cabe a tarefa de, por um lado, naturalizar a inferioridade racial dos colonizados e, por outro, patologizar o efeito tóxico que esta exerce sobre os seus corpos e mentes (ver: Warren, “Healing”). Contudo, também não podemos simplesmente dizer que se trata de uma questão de equívoco, pois a loucura reflecte uma posição em relação à sanidade. Acontece frequentemente que a pessoa mais segura da sua própria sanidade é considerada louca pelo mundo exterior; não existe um mecanismo verdadeiro ou justo para decidir isto de uma vez por todas. Bonaventure Ndikung lembra-nos que a sanidade e o saneamento estão relacionados através da raiz latina sanus (28): a sanidade é o que resulta quando o mundo social é higienizado, purificado de influências corruptoras. Na medida em que a administração colonial representa a sanidade e o saneamento, a resistência contra ela pode vir a ser vista como o delírio revolucionário que vence e assume uma insanidade sobrevivencialista – o momento em que um povo felizmente perdido “numa torrente onírica” se ” desliga” deste mundo e se recompõe em “sangue e lágrimas” (Fanon, 56).
3. A sanidade, fingida ou “real”, também é uma estratégia.
No seu artigo “Sly Normality: Between Quiescence and Revolt”, China Mills enumera as tácticas comuns utilizadas pelos loucos para assegurar a sua integridade corporal e a sua liberdade: pôr comprimidos debaixo da língua, mentir que as vozes pararam ou que já não se é suicida, fazer obediência. Qualquer pessoa que tenha sido internada numa enfermaria de um hospital ou que tenha estado perante um juiz num processo de internamento sabe que o normal é uma negociação entre partes em conflito. Todos aqueles que precisaram de apoio ou de serviços de uma das agências criadas para gerir a deficiência e a situação de sem-abrigo aprenderam as frases e as palavras-chave que devem ser ditas para obter resultados específicos ou evitar outros: “Já não ouço mais a voz” para reduzir ou manter a medicação, “não tenho tido pensamentos suicidas” para evitar o hospital ou perguntas de sondagem, e assim por diante. A sanidade não é um estado absoluto, mas uma posição num campo de batalha, como a “máscara branca” que um sujeito colonizado ou racializado usa no palco perigoso do capitalismo racial para se registar como são (King, 18). O mundo todo é um palco na sabedoria dos tolos. Tudo é uma loucura, mas não porque sejamos “realmente” loucos a passar por normais – o que implicaria que a sanidade e a insanidade são estados realmente existentes – mas antes porque estamos a imitar as maneiras que temos aprendido a usar para sobreviver (Mills, 212).
4. Por um lado, a ameaça do não-ser; por outro, a ameaça de termos de ser.
A dádiva da ajuda é muitas vezes um caso faustiano. Para ajudar os loucos ou os deficientes, as organizações sem fins lucrativos, as agências estatais e os grupos de defesa pedem-nos que nos apresentemos perante multidões em conferências, galas, cartazes anti-estigma ou vídeos inspiradores e que sejamos a deficiência que vêem em nós. Temos de evitar o convite para vestirmos o manto de malfeitores se isso significar ficarmos presos num diálogo cujas dimensões e limites já estão definidos para nós, pois nesse caso estaríamos apenas a fazer “uma anti-psiquiatria que é uma construção da psiquiatria” (222), como diz Mills. Por debaixo da oferta das campanhas anti-estigma de ser a pessoa que mantivemos escondida está a traiçoeira exigência de confessar. É absolutamente vital que aumentemos a rede de lugares onde é aceitável e expectável ser-se louco, mas também precisamos de espaços onde possamos ser algo diferente daquilo que somos, pois é aqui que vive a loucura da loucura. Ajudei a começar e tenho participado no grupo Hearing Voices nas Twin Cities desde 2018. Tipicamente associada a distúrbios psicóticos extremos como a esquizofrenia ou a bipolaridade, a audição de vozes (e mais tarde toda a experiência extrassensorial) neste modelo é apresentada como uma experiência com uma história paralela, mas já não essencialmente ligada à psiquiatria. É um exercício ridículo voltar atrás no tempo e identificar Sócrates, Joana d’Arc ou o profeta Maomé como esquizofrénicos, mas cada um deles pode ser adequada e justamente descrito como ouvinte de vozes. O grupo é explicitamente enquadrado como um conjunto social, ao contrário dos grupos de apoio de carácter mais clínico; em primeiro lugar, somos amigos e potenciais amigos. Por vezes, é importante para o participante questionar a sua experiência de tratamento, reduzir a medicação ou escapar ao pensamento de si próprio como essencialmente defeituoso. Ouvir a voz é uma posição de sujeito alternativa que centraliza a experiência concreta tal como é realmente vivida, acima de qualquer significado clínico, mas a desmedicalização não é certamente o objetivo para todos; por vezes, o grupo é um auxílio ou contrapeso aos apoios clínicos, validando e oferecendo suporte para as crises de vida que os médicos não abordam. Aqui, recolhemos e processamos informações sobre legislações bizantinas ou processos clínicos, oferecemos os apoios que podemos ou simplesmente ouvimos. Para outros, o grupo é um espaço onde podem explorar livremente o significado espiritual ou existencial de uma experiência, talvez deslegitimada ou ignorada noutros locais. Ao descrever os grupos de apoio de pares no Chile, Christian Montenegro refere-se a um deles como um “espaço deliberativo” onde “cada reunião relançava o grupo”. É este o cerne ético do problema da loucura e da identidade: como amar e apreciar o outro, como construir o poder, permitindo ao mesmo tempo que tudo e todos sejam sempre um pouco mais, um pouco menos ou um pouco diferentes do que são.
5. A psiquiatria é um arranjo estratégico
No Brasil, algo complicado é chamado de “bicho de sete cabeças”. A psiquiatria não é um Leviatã que nos assusta, mas uma Hidra cujas muitas cabeças espreitam em todas as direcções. Fazendo eco a uma observação de Foucault, podemos dizer que o poder psiquiátrico não desce a encosta como um único rio caudaloso, mas é constituído por muitos rios, seus afluentes e reservatórios congelados. Caímos nos seus capilares, muitos dos quais não são oficialmente espaços psi. O poder psiquiátrico flui para fora dos consultórios e das alas dos psiquiatras, tal como o poder político flui muito facilmente para fora dos parlamentos e das câmaras municipais. A unidade do poder psiquiátrico reside na sua diversidade e capacidade de adaptação. Os seus limites indeterminados e mutáveis entre a delimitação do espaço institucional e a aplicabilidade potencialmente universal funcionam a seu favor em tempos de crise. Se quisermos ter uma imagem mais clara de um sistema funcional – por oposição a apenas uma parte – talvez o melhor lugar para procurar não seja o manicómio densamente lotado de ontem ou a imagem duradoura do divã do psicoterapeuta, mas sim as unidades de observação das enfermarias hospitalares e policlínicas, pois é aqui que os pacientes são trazidos para serem examinados, brevemente observados, antes de serem classificados, medicados, recomendados, libertados ou enviados para o julgamento. Alguns deles serão transferidos para instalações de segurança mais elevada, outros receberão ordens restritivas de tratamento ambulatório que os obrigarão a fazer consultas, terapia ou tomar medicamentos. É para aqui que a polícia costuma trazer os loucos que recolhe na rua e onde as pessoas se internam quando não sabem o que fazer. Quando chega a altura de cortar nos custos, há carrinhas, autocarros e comboios que se dirigem para os grandes hospitais, onde se realizam trabalhos forçados ou, nos casos mais extremos, para campos ou gabinetes onde os improdutivos são esterilizados ou mesmo mortos. Quando os soldados já não aguentam mais, mandam vir os psiquiatras e eles invertem toda a sua noção de mente durante uma década, só a fim de manter o mundo violento unido pelas suas costuras rasgadas. Agentes da mesma disciplina podem administrar electrochoques em prisões políticas num espaço e vender programas de otimização pessoal a administradores noutro, ao mesmo tempo que reivindicam uma integridade interior. Se quisermos encontrar a sua lógica unitária, não a encontraremos nos livros de registo das empresas farmacêuticas ou nos diários dos superintendentes, mas nas suas respostas flexíveis às crises históricas. Quer se trate de um esquema classificatório para organizar os comportamentos pelo mundo, de uma lógica de governação para gerir populações excedentárias, de uma escusa médica para um sistema carcerário paralelo, de um preditor de violência futura através da vigilância da escola ou do local de trabalho, ou de uma ferramenta linguística casual para estigmatizar a anormalidade, a psiquiatria visa difundir tensões, resolver conflitos com meios técnicos quando é necessária ação política e as soluções técnicas apenas confundem a questão.
6. O carácter da resistência corresponde à contradição em causa, podendo aprofundá-la ou resolvê-la por outros meios.
Resistir à psiquiatria é abraçar o abandono no deserto. A humildade é justificada neste ponto: os projectos “oficiais” de anti-psiquiatria ou psiquiatria radical que examinámos, e todos os grupos que existem hoje, são gotas no oceano daqueles que são afectados pela psiquiatria e daqueles que lhe resistem. A história de pequenas sabotagens hospitalares, furtos de tempo, romances secretos, participação fingida e zombeteira, motins nas enfermarias e fugas ainda não foi contada; grande parte dela está sem dúvida perdida. A maior parte de nós responde na vida quotidiana a problemas e conflitos imediatos – àquela enfermeira cruel e abusiva do centro de tratamento regional, a um juiz omnisciente que pensa que sabe o que é melhor, e assim por diante – não ao “poder psiquiátrico”, e certamente não na sua maior parte como os loucos, mas a partir de uma miríade de posições de sujeito. Em Minneapolis, um grupo chamado Remembering With Dignity (Recordar com Dignidade), constituído por defensores dos deficientes, vasculhou os arquivos e encontrou os nomes de milhares de sepulturas não marcadas em asilos de todo o estado e tem realizado cerimónias de rededicação ao longo dos anos. Do mesmo modo, em Canton, no Dakota do Sul, os nativos vão todos os anos a um parque de golfe onde estão enterrados os seus antepassados para honrar os mortos no antigo local do Hospital Hiawatha para Índios Insanos. Embora o trabalho em asilos tenha sido tecnicamente interrompido com o caso Souder v. Brennan, a condição de servo ainda é praticada nas prisões e o trabalho sub-mínimo continua em oficinas protegidas e centros de dia. A história do tratamento dos loucos ecoa nestas lutas, mas são demasiadas vezes contadas à margem da história dos sobreviventes psiquiátricos e dos seus pares. Porquê? As representações das raças sempre incluíram uma distância marcada, uma identificação total ou uma relação hereditária com a loucura. As identidades e os destinos dos chamados toxicodependentes, criminosos, trabalhadores do sexo, delinquentes e queers são todos, em parte, determinados pelo poder psiquiátrico ou resistem à sua atração. Uma visão estática e binária do conflito histórico entre psiquiatras e reclusos ou empresas farmacêuticas e pacientes dessensibiliza-nos para a forma como o poder psiquiátrico se manifesta efetivamente em cada caso. Apesar da sua instabilidade, ele desempenhou e continua a desempenhar um papel fundamental na estruturação e reestruturação de hospitais, prisões, escolas, casa – em suma, a lógica psiquiátrica flui através de todo o campo social e institucional. As oposições binárias tendem a dissipar a indefinição quando a nossa linguagem nos falha: o senhorio com um diagnóstico de bipolaridade não é “par” do aluno suspenso por ter provocado uma confusão no pátio da escola, exceto no sentido mais imaterial e empobrecido da palavra. A sintonização com o funcionamento do poder e com as contradições em causa mantém-nos ancorados no fluxo do mundo e ilumina novos caminhos no deserto.
7. Há muito para destruir, mas isso não implica nem uma celebração da violência nem a sua denúncia ingénua.
A loucura e a violência sempre estiveram ligadas, seja sob a forma do maníaco delirante ou do imprevisível assassino esquizoide ou psicopata dos tempos modernos. A previsão de perigo futuro tem sido um dos principais critérios de internamento desde há décadas, e os activistas estão constantemente na defensiva, prontos a dissociar a categoria de “doente mental” da “violência” após os tiroteios em massa. Temos de começar pelos factos: o presente está repleto de violência. Só no meu próprio país: os espancamentos e as mortes misteriosas têm lugar nas prisões; a terra é roubada e esconde mortes em massa por baixo de urbanizações banais; perto de 50.000 pessoas suicidam-se todos os anos nos Estados Unidos; milhares morrem e ficam feridas em locais de trabalho perigosos; a polícia medica os malucos com drogas indutoras de coma, como a cetamina, sem o seu consentimento, e mata mais de 1000 pessoas por ano; as crianças são colocadas em prisões ou câmaras de isolamento na escola; os acampamentos de sem-abrigo são despejados aparentemente todas as semanas; as crianças morrem de ferimentos de bala; tantas pessoas sentem-se perseguidas, inseguras, agredidas, mas tudo isto é ignorado como ruído de fundo. Não devemos ser levados a negar ou a proclamar a violência ou a destruição segundo os termos de outrem, porque é evidente que matar não é assassínio quando está em jogo o lucro ou a ordem, e que a morte não é chorável quando os mortos não são “inocentes” e a violência não é legível. Sublinhar isto não é sugerir que qualquer ato é permitido contra a violência esmagadora, nem é celebrar actos “violentos” contra ela simplesmente porque são definidos como tal, pois estas posições continuam a aceitar os termos e definições que lhes são transmitidos e a marcar uma posição já pré-determinada. Uma abordagem “anti-violenta”, “não-destrutiva” ou “positiva” faz o mesmo a partir do ângulo oposto: a inocência e a passividade não podem ser a condição para a solidariedade quando um destruidor de mundos define o que significa ser violento. Os actos que ameaçam um sistema violento serão sempre marcados como violentos. Lembrem-se: “O facto de as coisas serem ‘status quo’ é a catástrofe”, lembra-nos Walter Benjamin, “não é uma possibilidade sempre presente, mas o que em cada caso é dado” (473). A falta de consciência de como a linguagem da violência determina quem choramos e quem desprezamos enfraquece a nossa sensibilidade para a forma como o poder psiquiátrico ajuda a estruturar a catástrofe que é o nosso presente.
8. Coragem: somos comprometidos e impuros na loucura.
Os grupos da Rede de Ouvidores de Vozes têm um alcance e uma aplicabilidade limitada com recursos limitados, mas, como demonstra o novo livro For Health Autonomy do Coletivo Carenotes, podem desempenhar um papel estratégico em momentos de crise, para além de ajudarem os indivíduos a reformularem a sua experiência ou a receberem os apoios necessários sem compromissos. No livro, discutem como, em condições de austeridade, um grupo Hearing Voices na Grécia foi um elemento crítico na implementação de uma forma essencialmente social de cuidados de saúde na rede de clínicas solidárias, assembleias de saúde de bairro e espaços sociais para a saúde. Isto faz sentido. As crises desestabilizam o terreno comum; aqueles que se organizam em torno da loucura já aprenderam a construir cidades com areia, mesmo que isso signifique reconstruir um pouco todos os dias. Nos espaços onde a loucura é a linguagem comum, aprende-se o que significa comunicar e construir laços com zero garantias de ser compreendido e igualmente poucas de acordar são amanhã. O apego a códigos, a adesão a vocabulários limitados ou a modelos transmitidos de cima para baixo ou do passado são neurolépticos por olharem diretamente para a frente e para trás. A abordagem oblíqua da loucura move-se dos cantos e recantos para a parede. Abraçar e trabalhar com a loucura significa aceitar que nada deve ser tomado como dado. A nossa semelhança não é determinada de antemão, mas construída à medida que avançamos. A nossa impureza – a catástrofe contínua que é a nossa vida – não é um impedimento, mas a nossa maior vantagem à medida que o mundo tende a colapsar.
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